Esta palavra diz um pouco de cada uma de nós, personagens muito diferentes diante da vida, ora meninas, ora mulheres, ora filhas dependentes, ora mães dadivosas, ora resignadas diante das angustias do mundo, ora revolucionárias na busca por um futuro mais humano. Nos desencontros, nos encontramos, e nessa MULTIPLICIDADE de personalidades, nos agrupamos. Somos, todas e cada uma, diferentes, porém iguais no gosto pela literatura.
segunda-feira, 28 de junho de 2010
Ele me bebeu por Carla Camurati
Esta é Carla de Andrade Camurati cineasta e atriz brasileira que desde 2007 preside a Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Ela participou da seleção de contos que deu origem ao livro Clarice na cabeceira e escolheu:
CONTO: Ele me bebeu
DO LIVRO: A VIA CRUCIS DO CORPO
APRESENTAÇÃO: Carla Camurati
DURANTE ALGUNS ANOS da minha vida, eu e meu querido amigo José Antonio Garcia gostávamos de passar a noite lendo, bebendo e fumando Clarice Lispector, eu um verdadeiro torpor em que às vezes tínhamos acessos de risos e às vezes chorávamos muito ... Ficávamos ali, consternados com as histórias das pessoas que em voz alta líamos um para o outro horas a fio. Parecíamos conhecer todos aqueles personagens. Ler Clarice Lispector é uma das viagens mais incríveis dentro da Alma humana. Podemos ver todas as sutilezas que na realidade protagonizam as nossas vidas: as inseguranças, os defeitos, as vergonhas e as alegrias. Todas ali expostas, mas expostas com tanto afeto e de forma tão contundente que em mim esse olhar que ela tem sobre as pessoas e o mundo mudou a minha maneira de perceber o outro. Desenvolveu em mim, com certeza, um olhar mais agudo e ao mesmo tempo mais generoso ... que muito me ajuda a viver nesse mundo.
Foram momentos deliciosos da minha vida, muito emocionantes! Escrevemos três roteiros juntos.
Um contava a história de Clarice, na qual eu faria uma das fases da sua vida. O filme começava com Clarice menina em Recife e ia até o final de seus dias.
Os outros dois eram adaptações desse saboroso livro A via crucis do corpo. Hum, que descoberta foi esse livro nas nossas noites! Tivemos uma febre por ele ... O primeiro roteiro que realizamos foi “O corpo”. José Antonio fez um filme muito especial, muito premiado e, infelizmente para nós, muito mal lançado. O elenco era? Antonio Fagundes, Marieta Severo e Claudia Gimenez. Eu fazia uma participação especial.
O outro é o meu conto escolhido, infelizmente não tenho mais o José Antonio ao meu lado para filmarmos juntos esse roteiro. “Ele me bebeu” é uma das mais interessantes tramas de amor contemporâneas que eu já li.
É uma história de amizade, competitividade, identidade, vaidade e renascimento. Tudo sem perder a delicadeza, como só Clarice sabia fazer. Aproveitem, agora, essa surpreendente história de Aurélia Nascimento e Serjoca passada nas noites curvas de Copacabana...
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sábado, 26 de junho de 2010
Perdoando Deus por Beth Goulart
Dentre tantas figuras representativas do cenário das artes não poderiam deixar de fora, da coletânea de contos que compôem o livro Clarice na cabeceria, aquela que veio a interpretar Clarice Lispector na peça Simplesmente EU, Clarice Lispector,
Beth Xavier Miessa Goulart popularmente conhecida como Beth Goulart, atriz brasileira, filha dos também atores Paulo Goulart e Nicette Bruno.
CONTO: Perdoando Deus
DO LIVRO: FELICIDADE CLANDESTINA
APRESENTAÇÃO: Beth Goulart
QUEM ANDANDO PELO JARDIM BOTÂNICO, ou pela Lagoa Rodrigo de Freitas ou ainda assistindo a um pôr do sol no Arpoador não se sentiu parte de alguma coisa maior, uma nova dimensão, parte de uma teia invisível e permanente que liga todas as coisas numa relação de interdependência de vida? Esta sensação é muito forte e abre em nossa consciência um espaço para invisível, o inominável, o absoluto ou ainda ao que chamamos de Deus. Esta força estranha e atraente que ora nos abraça ora nos repreende de acordo com a lei de nossas ações é o grande mistério do mundo.
Que relação podemos ter de intimidade e respeito, reverência ou medo diante do infinito e da grandeza, nós simples humanos, mortais e pecadores. Este conto nos leva a uma viagem pelo raciocínio de uma mulher que tocada pela beleza da vida se sente mãe de Deus, da Terra, das coisas e do mundo. É a intimidade perturbadora de que o micro está no macro e vice-versa.
Em sua prepotente eloqüência e liberdade, não percebe a presença reveladora de um rato morto em seu caminho, símbolo do que é pequeno e suo e de seus limites. Quantas vezes as lições da vida estão disfarçadas de pequenos acidentes cotidianos, pequenos tapas que levamos para acordar a consciência. Sua revolta se inicia pelo terror, seguido da ira com sentimentos de vingança infantil pela rejeição de Deus, ou pela simples e corriqueira expressão – Por que eu?
Aos poucos, ao se deparar com a conexão dos dois fatos e seu nexo, vê-se forçada a entender que amar é muito mais que aceitar a compreensão, é aceitar a incompreensão, que devemos amar ao que se é e não ao que gostaríamos que fosse, e que somos todos iguais, dependendo do ponto de vista. Para se amar a Deus é necessário amar todas as coisas vivas, o planeta, toda a humanidade, amar o bom e o belo, mas também amar o erro e a dor. A totalidade dos contrários, o caos, o tão, a música e o silêncio, entender e perdoar nosso limite e nosso tamanho para poder aumentá-lo. Não inventar Deus mas sentir Deus.
Postado por Irla
Beth Xavier Miessa Goulart popularmente conhecida como Beth Goulart, atriz brasileira, filha dos também atores Paulo Goulart e Nicette Bruno.
CONTO: Perdoando Deus
DO LIVRO: FELICIDADE CLANDESTINA
APRESENTAÇÃO: Beth Goulart
QUEM ANDANDO PELO JARDIM BOTÂNICO, ou pela Lagoa Rodrigo de Freitas ou ainda assistindo a um pôr do sol no Arpoador não se sentiu parte de alguma coisa maior, uma nova dimensão, parte de uma teia invisível e permanente que liga todas as coisas numa relação de interdependência de vida? Esta sensação é muito forte e abre em nossa consciência um espaço para invisível, o inominável, o absoluto ou ainda ao que chamamos de Deus. Esta força estranha e atraente que ora nos abraça ora nos repreende de acordo com a lei de nossas ações é o grande mistério do mundo.
Que relação podemos ter de intimidade e respeito, reverência ou medo diante do infinito e da grandeza, nós simples humanos, mortais e pecadores. Este conto nos leva a uma viagem pelo raciocínio de uma mulher que tocada pela beleza da vida se sente mãe de Deus, da Terra, das coisas e do mundo. É a intimidade perturbadora de que o micro está no macro e vice-versa.
Em sua prepotente eloqüência e liberdade, não percebe a presença reveladora de um rato morto em seu caminho, símbolo do que é pequeno e suo e de seus limites. Quantas vezes as lições da vida estão disfarçadas de pequenos acidentes cotidianos, pequenos tapas que levamos para acordar a consciência. Sua revolta se inicia pelo terror, seguido da ira com sentimentos de vingança infantil pela rejeição de Deus, ou pela simples e corriqueira expressão – Por que eu?
Aos poucos, ao se deparar com a conexão dos dois fatos e seu nexo, vê-se forçada a entender que amar é muito mais que aceitar a compreensão, é aceitar a incompreensão, que devemos amar ao que se é e não ao que gostaríamos que fosse, e que somos todos iguais, dependendo do ponto de vista. Para se amar a Deus é necessário amar todas as coisas vivas, o planeta, toda a humanidade, amar o bom e o belo, mas também amar o erro e a dor. A totalidade dos contrários, o caos, o tão, a música e o silêncio, entender e perdoar nosso limite e nosso tamanho para poder aumentá-lo. Não inventar Deus mas sentir Deus.
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sexta-feira, 25 de junho de 2010
A procura de uma dignidade por Benjamin Moser
Benjamin Moser, norte-americano, nascido em Houston e formado em História. Conheceu a obra de Clarice por acaso, na universidade, quando escolheu estudar português após fracassar no aprendizado de mandarim (chinês). Selecionou, no livro Clarice na cabeceira, dentre os muitos contos de Clarice, o seguinte:
CONTO: A Procura de uma dignidade
DO LIVRO: LAÇOS DE FAMÍLIA
APRESENTAÇÃO: Benjamin Moser
UMA JORNALISTA TELEFORNOU para desmarcar uma entrevista com Clarice Lispector, semanas antes de sua morte. Clarice aconselhou à jornalista, Norma Couri, que não desmarcasse, talvez sentindo que não haveria outra ocasião. Ficaram um tempo falando quando Clarice disse: “Eu ando sempre na contramão.” Norma demorou para entender que Clarice não estava falando metaforicamente: costumava andar literalmente de encontro ao fluxo dos transeuntes nas ruas do Rio de Janeiro.
“Meu drama: é que sou livre”, escreveu. Mas sentindo, ao lê-la, que a liberdade sempre foi, para ela, uma conquista árdua, um bem que nunca chegou a possuir seguramente, uma luta travada contra uma multidão, uma andança em contramão. A procura da liberdade contra um mundo todo feito para negá-la é um dos grandes temas de Clarice Lispector, desde Virgínia, de O Lustre, cuja liberdade é uma cara e frágil conquista: “Tomou um guardanapo, um pãozinho redondo ... com um esforço extraordinário, quebrando em si mesma uma resistência estupefata, desviando o destino, jogou-os pela janela- e assim ela conservara o poder”.
Como as personagens nas primeiras obras de Clarice Lispector, Virgínia é uma jovem; nas obras que se seguiram a O Lustre, as rebeldes adolescentes amadurecem, como sua autora, e se transformam em mães e donas de casa, até que, nos últimos anos de sua vida, as protagonistas de Clarice viram viúvas, avós: senhoras, como a sra. Jorge B. Xavier, a heroína desse conto, que nem um nome próprio tem. Consumada por um desejo patético por Roberto Carlos, fisicamente presa nas entranhas do estádio do Maracanã, não está mais à procura de uma liberdade: agora, ela só quer uma mais modesta”dignidade”. O tempo encurtando, com uma urgência mais palpitante ainda, ela só pede conservar o que resta de seu poder.
É nessa dramatização da crise de uma pessoa que bem sabe que a morte está se aproximando e que procura, por uma última vez que seja, andar na contramão, que vemos o poder sempre espantoso de Clarice Lispector, de nos ajudar a sentir “até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador”.
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quarta-feira, 23 de junho de 2010
A Fuga por Artur Xexéo
Dando sequência ao livro Clarice na cabeceira, apresentamos:
CONTO: A Fuga
DO LIVRO: A BELA E A FERA
APRESENTAÇÃO: Artur Xexéo
Artur Xexéo é jornalista. Colunista e editor do "Segundo Caderno" do veículo O Globo, e introduz seu conto selecionado assim:
QUANDO ESCREVEU “A FUGA”, Clarice tinha seus vinte e poucos anos e estava publicando seus primeiros contos. Ainda não tinha lançado Perto do coração selvagem ainda não era uma escritora famosa. Ainda não era a Clarice que viria a ser. É nesses contos, e especialmente em “A fuga”, que aparece a mulher que seria seu personagem constante por muito tempo e que revela as inquietações de Clarice àquela época. É uma mulher que tem medo, que está decidida a tomar um novo rumo, mas que ainda não sabe bem qual é. Ela quer se transformar, mas não sabe em quê. É uma mulher cansada que toma uma resolução. No caso do conto, a resolução não é das mais sofisticadas: ela sai de casa e não pretende voltar. Aproveita um dia de chuva com o que acredita ser a liberdade. É uma mulher confusa, pronta para novas descobertas. Ela acredita que o mundo vai mudar logo após virar uma esquina. Vivendo um casamento sem graça há 12 anos, ela agora sente-se independente só porque tomou a decisão de sair de casa. A certa altura, ela mesma se define: “Eu era uma mulher casada e agora sou uma mulher”. Vinte e pouco parágrafos depois de anunciar sua suposta liberdade, “a mulher com medo” de Clarice retorna à casa. Deixa de ser uma mulher. Volta a ser uma mulher casada.
A protagonista de “A fuga” tornou-se um lugar-comum nos primeiros contos de Clarice Lispector. É a mulher insatisfeita que, mesmo que opte pela independência, pela liberdade, não sabe muito bem o que fazer com elas e acaba retornando a rotina de sempre. Em às vezes, a mesma “mulher cansada” aparece como uma solteirona solitária. Ou como uma velha que se arrepende de não ter escolhido determinado caminho muitos anos atrás. A mulher das primeiras experiências de Clarice com a ficção está sempre diante da possibilidade de um novo caminho. Mas não tem coragem de segui-lo. Ou percebe que as mudanças talvez só aconteçam mesmo em caminhos internos. Com um passado frustrado e um presente medíocre, ela perde-se nos labirintos do futuro. E caminha, implacavelmente, para um final nada feliz.
Relido hoje, é impressionante como “A fuga” já anunciava a mulher- e escritora – que Clarice se tornaria e, principalmente, como ele desenhava com previsão a insatisfação da mulher com o papel que a sociedade da primeira metade do século lhe reservava. Essa mulher só viria à tona quase duas décadas depois. Mas já existe nos primeiros contos d Clarice, aqueles escritos no comecinho dos anos 1940, certamente maturados no fim dos anos 1930. A mulher de Clarice Lispector estava sempre imaginando que hoje, finalmente hoje, alguma coisa diferente iria lhe acontecer. Mas, ao fim de cada um dos contos – às vezes, a solução para “a mulher com medo” era o suicídio -, descobria-se que não bastava querer, esperar, imaginar. “A mulher cansada” de Clarice tinha que agir.
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CONTO: A Fuga
DO LIVRO: A BELA E A FERA
APRESENTAÇÃO: Artur Xexéo
Artur Xexéo é jornalista. Colunista e editor do "Segundo Caderno" do veículo O Globo, e introduz seu conto selecionado assim:
QUANDO ESCREVEU “A FUGA”, Clarice tinha seus vinte e poucos anos e estava publicando seus primeiros contos. Ainda não tinha lançado Perto do coração selvagem ainda não era uma escritora famosa. Ainda não era a Clarice que viria a ser. É nesses contos, e especialmente em “A fuga”, que aparece a mulher que seria seu personagem constante por muito tempo e que revela as inquietações de Clarice àquela época. É uma mulher que tem medo, que está decidida a tomar um novo rumo, mas que ainda não sabe bem qual é. Ela quer se transformar, mas não sabe em quê. É uma mulher cansada que toma uma resolução. No caso do conto, a resolução não é das mais sofisticadas: ela sai de casa e não pretende voltar. Aproveita um dia de chuva com o que acredita ser a liberdade. É uma mulher confusa, pronta para novas descobertas. Ela acredita que o mundo vai mudar logo após virar uma esquina. Vivendo um casamento sem graça há 12 anos, ela agora sente-se independente só porque tomou a decisão de sair de casa. A certa altura, ela mesma se define: “Eu era uma mulher casada e agora sou uma mulher”. Vinte e pouco parágrafos depois de anunciar sua suposta liberdade, “a mulher com medo” de Clarice retorna à casa. Deixa de ser uma mulher. Volta a ser uma mulher casada.
A protagonista de “A fuga” tornou-se um lugar-comum nos primeiros contos de Clarice Lispector. É a mulher insatisfeita que, mesmo que opte pela independência, pela liberdade, não sabe muito bem o que fazer com elas e acaba retornando a rotina de sempre. Em às vezes, a mesma “mulher cansada” aparece como uma solteirona solitária. Ou como uma velha que se arrepende de não ter escolhido determinado caminho muitos anos atrás. A mulher das primeiras experiências de Clarice com a ficção está sempre diante da possibilidade de um novo caminho. Mas não tem coragem de segui-lo. Ou percebe que as mudanças talvez só aconteçam mesmo em caminhos internos. Com um passado frustrado e um presente medíocre, ela perde-se nos labirintos do futuro. E caminha, implacavelmente, para um final nada feliz.
Relido hoje, é impressionante como “A fuga” já anunciava a mulher- e escritora – que Clarice se tornaria e, principalmente, como ele desenhava com previsão a insatisfação da mulher com o papel que a sociedade da primeira metade do século lhe reservava. Essa mulher só viria à tona quase duas décadas depois. Mas já existe nos primeiros contos d Clarice, aqueles escritos no comecinho dos anos 1940, certamente maturados no fim dos anos 1930. A mulher de Clarice Lispector estava sempre imaginando que hoje, finalmente hoje, alguma coisa diferente iria lhe acontecer. Mas, ao fim de cada um dos contos – às vezes, a solução para “a mulher com medo” era o suicídio -, descobria-se que não bastava querer, esperar, imaginar. “A mulher cansada” de Clarice tinha que agir.
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quarta-feira, 16 de junho de 2010
Amor por Affonso Romano de Sant´Anna
Affonso Romano de Sant'Anna, escritor brasileiro foi cronista no Jornal do Brasil (1984-1988) e do jornal O Globo até 2005. Atualmente escreve para os jornais Estado de Minas e Correio Brasiliense.
Affonso escolheu, para comentar, no livro Clarice na cabeceira:
CONTO: Amor
DO LIVRO: LAÇOS DE FAMÍLIA
APRESENTAÇÃO: Affonso Romano de Sant´Anna
ESTE CONTO “AMOR” (Laços de Família) me parece exemplar para o estudo de um dos temas mais fortes de Clarice – a epifania. Tratei disto primeiramente em Análise estrutural de romances brasileiros (1974) e mais amplamente no ensaio “ O ritual epifânico do texto” (1988), que acompanha o volume A paixão segundo G.H. editado pela UNESCO/UFSC e que republiquei em Que fazer de Ezra Pound (Imago).
A trajetória da personagem Ana – simples dona de casa – que certo dia sai da “raiz firme das coisas” e penetra “a hora perigosa da tarde” experimentando uma revelação/crise/náusea que a expulsa da “cegueira” cotidiana, é o movimento que vai se repetir em outros contos e nos romances de Clarice. Seus personagens estão sempre sendo submetidos a um conhecimento súbito da “verdade” em meio à banalidade da vida. Há um “rito de passagem”, uma “iniciação” perigosa e sublime, que arrebata não só seus personagens, mas também o leitor e a própria narradora.
E desse arrebatamento que fala toda a obra de Clarice. E a melhor literatura é isso: é a fratura, o corte, o impacto dentro da trivialidade da vida. Clarice dedicou sua vida a revelar este espanto. E é este espanto que deixa os seus leitores igualmente atordoados.
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terça-feira, 15 de junho de 2010
Menino a bico de pena por Adriana Lisboa
Dando continuidade aos post´s, acerca do livro Clarice na cabeceira, da Editora Rocco, escolhemos o:
CONTO: Menino a bico de pena
DO LIVRO: FELICIDADE CLANDESTINA
APRESENTAÇÃO: Adriana Lisboa
Adriana Lisboa é uma escritora brasileira, autora de nove livros de ficção e integrou várias antologias de contos no Brasil e no exterior.
COMO CONHECER JAMAIS O MENINO. Lá está ele, um ponto no infinito, mas inteiramente atual, feito somente de um agora que já é outro agora. No conto “Menino a bico de pena” Clarice desenha. Não pode ser com carvão. É preciso desenhar o menino com o traço mais fino de todos. Com o traço que, como o próprio menino, seja ainda só atualidade e infinitude. Um traço preciso como a palavra de um mestre zen, que nunca sobra, que nunca falta. E espaçoso em seus limites, ao mesmo tempo, porque só aquilo que sabe ser inteiramente agora pode passear com desenvoltura sobre a vertigem do infinito: esse menino, a bico de pena, antes da domesticação. Antes de virar humano e rombudo, presa do tempo adulto cotidiano. Antes de abrir mão, de uma vez por todas, da sua infinitude, da sua genuína loucura, cooperando - assim como fizeram os outros homens antes dele, e o Deus desses homens também. Por enquanto, o mundo fora do menino é aquilo que está dentro dele: o que ele enxerga (e só existe por isso: porque ele enxerga), o que se firma e o que cambaleia (quando ele se move, é o chão que se move). E o menino, ainda em seu retrato a bico de pena, antes de qualquer destino trágico e de crescer em médico ou carpinteiro, é aquele que mantém a curiosidade diante da fralda molhada ou do pingo de baba: porque o mundo é novo e se aquilata em maravilhas por minuto. Mesmo que ele já saiba que não morrer é mãe, e que é preciso saber chorar por isso.
Postado por Irla
CONTO: Menino a bico de pena
DO LIVRO: FELICIDADE CLANDESTINA
APRESENTAÇÃO: Adriana Lisboa
Adriana Lisboa é uma escritora brasileira, autora de nove livros de ficção e integrou várias antologias de contos no Brasil e no exterior.
COMO CONHECER JAMAIS O MENINO. Lá está ele, um ponto no infinito, mas inteiramente atual, feito somente de um agora que já é outro agora. No conto “Menino a bico de pena” Clarice desenha. Não pode ser com carvão. É preciso desenhar o menino com o traço mais fino de todos. Com o traço que, como o próprio menino, seja ainda só atualidade e infinitude. Um traço preciso como a palavra de um mestre zen, que nunca sobra, que nunca falta. E espaçoso em seus limites, ao mesmo tempo, porque só aquilo que sabe ser inteiramente agora pode passear com desenvoltura sobre a vertigem do infinito: esse menino, a bico de pena, antes da domesticação. Antes de virar humano e rombudo, presa do tempo adulto cotidiano. Antes de abrir mão, de uma vez por todas, da sua infinitude, da sua genuína loucura, cooperando - assim como fizeram os outros homens antes dele, e o Deus desses homens também. Por enquanto, o mundo fora do menino é aquilo que está dentro dele: o que ele enxerga (e só existe por isso: porque ele enxerga), o que se firma e o que cambaleia (quando ele se move, é o chão que se move). E o menino, ainda em seu retrato a bico de pena, antes de qualquer destino trágico e de crescer em médico ou carpinteiro, é aquele que mantém a curiosidade diante da fralda molhada ou do pingo de baba: porque o mundo é novo e se aquilata em maravilhas por minuto. Mesmo que ele já saiba que não morrer é mãe, e que é preciso saber chorar por isso.
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quinta-feira, 10 de junho de 2010
Ruído de passos por Adriana Falcão
Iniciando a sequencia de posts, de apresentações dos contos de Clarice Lispector, do livro Clarice na cabeceira ,trago comentários de Adriana Falcãocom sobre seu conto selecionado.
Para os que não conhecem ela é é uma roteirista e escritora brasileira. Atualmente, roteirista da TV Globo, escreve para séries como Comédias da Vida Privada e A Grande Família, além de roteiros para cinema e a série Mulher.
CONTO: Ruído de passos
DO LIVRO: A VIA CRUCIS DO CORPO
APRESENTAÇÃO: Adriana Falcão
“Sabia, gosto de você chegar assim, arrancando páginas dentro de mim desde o primeiro dia.”
Chico Buarque
GOSTO QUANDO CLARICE chega assim e me dá uma rasteira.
Aconteceu com “Ruídos de passos”.
Comecei a me apaixonar por dona Cândida Raposo nas primeiras linhas do conto.
Quem não se apaixonaria por uma velhinha de 81 anos que tem vertigem de viver?
“A altitude”, “o verde das árvores”, “a chuva”, “arrepios com Liszt”, “perfume de rosa”, e vamos compreendendo a vertigem de dona Cândida. Até que ela nos surpreende, quando vai ao consultório médico se queixar que “ainda tem a coisa”. Além de “a coisa”, dona Cândida também se refere ao seu desejo de prazer como “o inferno”. O diagnóstico do médico é preciso: “é a vida”.
Quando achamos que era isso, que idéia corajosa, um conto sobre uma velhinha aristocrática que ainda sente volúpia sexual, e decide, sem mais alternativas, resolver seu problema sozinha, claro que Clarice vai além.
A filha que espera no carro, lá fora, o filho morto na guerra e “a intolerável dor no coração de sobreviver a um ser adorado”, e lá vou eu me apaixonando cada vez mais por essa dona Cândida, gente, bicho, ser vivo. E não é que ela resolve se satisfazer sozinha, todas as noites, “sempre tristes”, “esperando a bênção da morte?”
O ruído de passos de seu marido, Antenor Raposo, me assusta como um filme de suspense.
E eu sinto a vida como um filme de suspense, e adoro e odeio minhas vertigens.
Postado por Irla
Para os que não conhecem ela é é uma roteirista e escritora brasileira. Atualmente, roteirista da TV Globo, escreve para séries como Comédias da Vida Privada e A Grande Família, além de roteiros para cinema e a série Mulher.
CONTO: Ruído de passos
DO LIVRO: A VIA CRUCIS DO CORPO
APRESENTAÇÃO: Adriana Falcão
“Sabia, gosto de você chegar assim, arrancando páginas dentro de mim desde o primeiro dia.”
Chico Buarque
GOSTO QUANDO CLARICE chega assim e me dá uma rasteira.
Aconteceu com “Ruídos de passos”.
Comecei a me apaixonar por dona Cândida Raposo nas primeiras linhas do conto.
Quem não se apaixonaria por uma velhinha de 81 anos que tem vertigem de viver?
“A altitude”, “o verde das árvores”, “a chuva”, “arrepios com Liszt”, “perfume de rosa”, e vamos compreendendo a vertigem de dona Cândida. Até que ela nos surpreende, quando vai ao consultório médico se queixar que “ainda tem a coisa”. Além de “a coisa”, dona Cândida também se refere ao seu desejo de prazer como “o inferno”. O diagnóstico do médico é preciso: “é a vida”.
Quando achamos que era isso, que idéia corajosa, um conto sobre uma velhinha aristocrática que ainda sente volúpia sexual, e decide, sem mais alternativas, resolver seu problema sozinha, claro que Clarice vai além.
A filha que espera no carro, lá fora, o filho morto na guerra e “a intolerável dor no coração de sobreviver a um ser adorado”, e lá vou eu me apaixonando cada vez mais por essa dona Cândida, gente, bicho, ser vivo. E não é que ela resolve se satisfazer sozinha, todas as noites, “sempre tristes”, “esperando a bênção da morte?”
O ruído de passos de seu marido, Antenor Raposo, me assusta como um filme de suspense.
E eu sinto a vida como um filme de suspense, e adoro e odeio minhas vertigens.
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quarta-feira, 9 de junho de 2010
Clarice na cabeceira
A leitura dos textos, contos, romances, enfim dos livros de Clarice Lispector nos fez encontrar a nós mesmas. Se você não tiver paciência para ler muito basta apenas uma frase para transformar o seu mundo.
E essa paixão, que nos toma, pelos escritos de Clarice, impulsiona-nos a vontade de dividir, de ver mais e mais pessoas achando seu eu perdido na rotina e no cotidiano.
Nesse sentido a Editora Rocco foi muito feliz publicando Clarice na cabeceira livro no qual leitores famosos escolhem seus contos preferidos e comentam-nos. Não bastasse isso, a editora doou uma coleção completa de Clarice Lispector para cada uma das bibliotecas indicadas pelos leitores convidados.
Então, com o desejo de vê-los apaixonados pela Clarice, transcreveremos a introdução do livro e os comentários de leitores, famosos, sobre seus contos selecionados.
Apresentamos-lhes “Clarice na cabeceira”
Introdução
Clarice na cabeceira é uma seleção afetiva de 22 contos de Clarice Lispector feita por leitores que se dedicam a criar “instantes de beleza” em seus trabalhos: são escritores, atrizes, cineastras, cantoras, críticos literários e jornalistas. A frase de Guimarães Rosa ecoa no texto que cada leitor convidado escreveu: “Clarice, eu não leio você para a literatura, mas para a vida”. Esta frase tocou tanto a escritora a ponto de ela registrá-la numa crônica em sua coluna no Jornal do Brasil.
Clarice Lispector sempre declarou seu amor por aqueles que tinham paciência de esperá-la através da palavra escrita. Ainda em vida, ela recebeu o carinho dos leitores sob diversas formas. Mas quem é esse personagem chamado leitor? Clarice respondeu: “O personagem leitor é um personagem curioso, estranho. Ao mesmo tempo que inteiramente individual e com reações próprias, é tão terrivelmente ligado ao escritor que na verdade ele, o leitor, é o escritor”.
Desde que Clarice Lispector nos deixou, novas formas de declarar seu amor por ela e por sua obra foram encontradas. Uma legião de fãs cresce a cada ano, são principalmente jovens que fazem de Clarice o seu livro de cabeceira e gostam de registrar essa paixão nos seus diários virtuais na internet. Os números impressionam: no Google há mais de um milhão de entradas para Lispector no mundo todo e cerca de 900 mil em português, 642 mil referências para blogs e 57 mil para fotologs. No Orkut são 150 comunidades associadas ao seu nome, num total de 260 mil pessoas. Alguns títulos dessas comunidades retratam como os leitores se sentem diante da obra de Clarice: “Eu amo Clarice Lispector”, “Clarice Lispector me lê”, “Clarice Lispector fala por mim”, “Clarice Lispector me entende”.
Clarice está no mundo virtual, no cinema, no teatro, na dança, na televisão, na música. Ela continua atravessando as fronteiras e cativando leitores de todos os continentes. É traduzida em línguas mais conhecidas como inglês, francês, italiano, alemão e espanhol, e em línguas raras como croata, coreano, finlandês, sueco, hebraico, grego, tcheco, russo, catalão, turco e japonês. Objeto de inúmeras teses acadêmicas no Brasil e no exterior (onde destaca-se como a autora brasileira mais estudada), ocupa um lugar de destaque numa pesquisa internacional desenvolvida pelo projeto Conexões Itaú Cultural – Mapeamento da Literatura Brasileira: depois de Machado de Assis, seu nome é o mais lembrado pelos tradutores, professores e bibliotecários estrangeiros.
Gregory Rabassa, o renomado tradutor americano de Gabriel García Márquez, Jorge Amado, Mario Vargas Llosa e da própria Clarice, classificou-a como um dos mais influentes escritores brasileiros, descrita como a Kafka da ficção latino-americana. Quando ele fala sobre Clarice, seu comentário não se restringe ao aspecto literário: “Ela era tão bela, fiquei chocado ao encontrar uma pessoa rara que se parecia como Marlene Dietrich e escrevia como Virginia Woolf”. (New York Times, 11 de março de 2005).
Vivendo numa aldeia global, e mesmo assistindo ao surgimento dos livros virtuais, a obra de Clarice Lispector aumenta seu contingente de leitores porque há o companheiro de todas as horas à nossa espera na cabeceira.
Clarice na cabeceira reúne contos de cada um dos livros de sua produção contística: Laços de família (1960), A legião estrangeira (1964), Felicidade Clandestina (1971), A via crucis o corpo (1974), Onde estivestes de noite (1974) e A bela e a fera (1979).
Desde Laços de família, ela apresenta uma nova narrativa dissolvendo os esquemas naturalistas, segundo os quais um conto seria uma história com início, meio e fim. A publicação desta obra se deu no momento em que a escritora retornava ao Brasil, após 16 anos residindo no exterior, ao lado do marido diplomata e dos filhos. Sua volta marcou o reinício de sua trajetória literária, pois seus três primeiros romances datavam da década de 1940 e a publicação de Alguns contos (1952), pelo Ministério da Educação e Saúde – contendo seis contos de Laços de família – não teve nenhuma repercussão. A recepção de Laços de família foi muito bem-sucedida levando a mesma editora que lançou o livro de contos a também publicar no ano seguinte o romance A maça no escuro.
Foram os contos, portanto, que colocaram Clarice Lispector mais próxima dos seus leitores. Isso não significa que desde a estréia do romance Perto do coração selvagem (1943) ela não tenha sido reconhecida como um novo talento da literatura brasileira. No entanto, quando a revista Senhor publicou, no final da década de 1950, contos como A menor mulher do mundo, Feliz Aniversário e A imitação da rosa, a resposta positiva do público foi imediata e despertou o interesse das editoras.
O segundo livro, A legião estrangeira (1964), concomitante com a publicação de A paixão segundo G.H. no mesmo ano, reuniu entre outros, alguns contos publicados na Senhor, mas a sua recepção se expandiu quando o grande público pôde ler alguns deles na coluna de Clarice no Jornal do Brasil, entre 1967-1973.
No início da década de 1970, Felicidade Clandestina (1971) resgata contos de A legião estrangeira e crônicas do Jornal do Brasil. O que é crônica e o que é conto nesse livro? Os gêneros se misturam. Clarice afirmava: “Gênero não me pega mais”. E mais uma vez sua escrita insólita atravessava a nossa literatura tal como previa Alceu Amoroso Lima ao ler O lustre (1946): “Ninguém escreve como ela. Ela não escreve como ninguém”.
Nos últimos livros de contos, Onde estivestes de noite, A via crucis do corpo, e A bela e a fera (este último, um livro póstumo reunindo os primeiros contos datados da década de 1940, além de dois contos inéditos, provavelmente os últimos que escreveu), Clarice continuava experimentando no campo da linguagem, sem fazer concessões, mas agora buscando um modo de dizer mais direto, mais explícito. Segundo alguns críticos, rejeita os artifícios da arte e parece ser ela mesma, indisfarçável aos olhos do leitor.
Clarice na cabeceira torna-se, portanto, um livro singular, onde o leitor convidado pode compartilhar com outros leitores a experiência de ser leitor de Clarice Lispector. Agradecemos a contribuição de todos os leitores participantes deste livro que disseram com amor o nome de Clarice Lispector, fazendo-nos experimentar em sua companhia o delicado da vida.
Entremos, pois, em comunhão, e vamos ao encontro de Clarice.
Amém para todos nós.
Teresa Montero
Doutora em Letras pela PUC-RJ, autora de Eu sou uma pergunta. Uma biografia de Clarice Lispector (Rocco)
Postado por Irla
E essa paixão, que nos toma, pelos escritos de Clarice, impulsiona-nos a vontade de dividir, de ver mais e mais pessoas achando seu eu perdido na rotina e no cotidiano.
Nesse sentido a Editora Rocco foi muito feliz publicando Clarice na cabeceira livro no qual leitores famosos escolhem seus contos preferidos e comentam-nos. Não bastasse isso, a editora doou uma coleção completa de Clarice Lispector para cada uma das bibliotecas indicadas pelos leitores convidados.
Então, com o desejo de vê-los apaixonados pela Clarice, transcreveremos a introdução do livro e os comentários de leitores, famosos, sobre seus contos selecionados.
Apresentamos-lhes “Clarice na cabeceira”
Introdução
Clarice na cabeceira é uma seleção afetiva de 22 contos de Clarice Lispector feita por leitores que se dedicam a criar “instantes de beleza” em seus trabalhos: são escritores, atrizes, cineastras, cantoras, críticos literários e jornalistas. A frase de Guimarães Rosa ecoa no texto que cada leitor convidado escreveu: “Clarice, eu não leio você para a literatura, mas para a vida”. Esta frase tocou tanto a escritora a ponto de ela registrá-la numa crônica em sua coluna no Jornal do Brasil.
Clarice Lispector sempre declarou seu amor por aqueles que tinham paciência de esperá-la através da palavra escrita. Ainda em vida, ela recebeu o carinho dos leitores sob diversas formas. Mas quem é esse personagem chamado leitor? Clarice respondeu: “O personagem leitor é um personagem curioso, estranho. Ao mesmo tempo que inteiramente individual e com reações próprias, é tão terrivelmente ligado ao escritor que na verdade ele, o leitor, é o escritor”.
Desde que Clarice Lispector nos deixou, novas formas de declarar seu amor por ela e por sua obra foram encontradas. Uma legião de fãs cresce a cada ano, são principalmente jovens que fazem de Clarice o seu livro de cabeceira e gostam de registrar essa paixão nos seus diários virtuais na internet. Os números impressionam: no Google há mais de um milhão de entradas para Lispector no mundo todo e cerca de 900 mil em português, 642 mil referências para blogs e 57 mil para fotologs. No Orkut são 150 comunidades associadas ao seu nome, num total de 260 mil pessoas. Alguns títulos dessas comunidades retratam como os leitores se sentem diante da obra de Clarice: “Eu amo Clarice Lispector”, “Clarice Lispector me lê”, “Clarice Lispector fala por mim”, “Clarice Lispector me entende”.
Clarice está no mundo virtual, no cinema, no teatro, na dança, na televisão, na música. Ela continua atravessando as fronteiras e cativando leitores de todos os continentes. É traduzida em línguas mais conhecidas como inglês, francês, italiano, alemão e espanhol, e em línguas raras como croata, coreano, finlandês, sueco, hebraico, grego, tcheco, russo, catalão, turco e japonês. Objeto de inúmeras teses acadêmicas no Brasil e no exterior (onde destaca-se como a autora brasileira mais estudada), ocupa um lugar de destaque numa pesquisa internacional desenvolvida pelo projeto Conexões Itaú Cultural – Mapeamento da Literatura Brasileira: depois de Machado de Assis, seu nome é o mais lembrado pelos tradutores, professores e bibliotecários estrangeiros.
Gregory Rabassa, o renomado tradutor americano de Gabriel García Márquez, Jorge Amado, Mario Vargas Llosa e da própria Clarice, classificou-a como um dos mais influentes escritores brasileiros, descrita como a Kafka da ficção latino-americana. Quando ele fala sobre Clarice, seu comentário não se restringe ao aspecto literário: “Ela era tão bela, fiquei chocado ao encontrar uma pessoa rara que se parecia como Marlene Dietrich e escrevia como Virginia Woolf”. (New York Times, 11 de março de 2005).
Vivendo numa aldeia global, e mesmo assistindo ao surgimento dos livros virtuais, a obra de Clarice Lispector aumenta seu contingente de leitores porque há o companheiro de todas as horas à nossa espera na cabeceira.
Clarice na cabeceira reúne contos de cada um dos livros de sua produção contística: Laços de família (1960), A legião estrangeira (1964), Felicidade Clandestina (1971), A via crucis o corpo (1974), Onde estivestes de noite (1974) e A bela e a fera (1979).
Desde Laços de família, ela apresenta uma nova narrativa dissolvendo os esquemas naturalistas, segundo os quais um conto seria uma história com início, meio e fim. A publicação desta obra se deu no momento em que a escritora retornava ao Brasil, após 16 anos residindo no exterior, ao lado do marido diplomata e dos filhos. Sua volta marcou o reinício de sua trajetória literária, pois seus três primeiros romances datavam da década de 1940 e a publicação de Alguns contos (1952), pelo Ministério da Educação e Saúde – contendo seis contos de Laços de família – não teve nenhuma repercussão. A recepção de Laços de família foi muito bem-sucedida levando a mesma editora que lançou o livro de contos a também publicar no ano seguinte o romance A maça no escuro.
Foram os contos, portanto, que colocaram Clarice Lispector mais próxima dos seus leitores. Isso não significa que desde a estréia do romance Perto do coração selvagem (1943) ela não tenha sido reconhecida como um novo talento da literatura brasileira. No entanto, quando a revista Senhor publicou, no final da década de 1950, contos como A menor mulher do mundo, Feliz Aniversário e A imitação da rosa, a resposta positiva do público foi imediata e despertou o interesse das editoras.
O segundo livro, A legião estrangeira (1964), concomitante com a publicação de A paixão segundo G.H. no mesmo ano, reuniu entre outros, alguns contos publicados na Senhor, mas a sua recepção se expandiu quando o grande público pôde ler alguns deles na coluna de Clarice no Jornal do Brasil, entre 1967-1973.
No início da década de 1970, Felicidade Clandestina (1971) resgata contos de A legião estrangeira e crônicas do Jornal do Brasil. O que é crônica e o que é conto nesse livro? Os gêneros se misturam. Clarice afirmava: “Gênero não me pega mais”. E mais uma vez sua escrita insólita atravessava a nossa literatura tal como previa Alceu Amoroso Lima ao ler O lustre (1946): “Ninguém escreve como ela. Ela não escreve como ninguém”.
Nos últimos livros de contos, Onde estivestes de noite, A via crucis do corpo, e A bela e a fera (este último, um livro póstumo reunindo os primeiros contos datados da década de 1940, além de dois contos inéditos, provavelmente os últimos que escreveu), Clarice continuava experimentando no campo da linguagem, sem fazer concessões, mas agora buscando um modo de dizer mais direto, mais explícito. Segundo alguns críticos, rejeita os artifícios da arte e parece ser ela mesma, indisfarçável aos olhos do leitor.
Clarice na cabeceira torna-se, portanto, um livro singular, onde o leitor convidado pode compartilhar com outros leitores a experiência de ser leitor de Clarice Lispector. Agradecemos a contribuição de todos os leitores participantes deste livro que disseram com amor o nome de Clarice Lispector, fazendo-nos experimentar em sua companhia o delicado da vida.
Entremos, pois, em comunhão, e vamos ao encontro de Clarice.
Amém para todos nós.
Teresa Montero
Doutora em Letras pela PUC-RJ, autora de Eu sou uma pergunta. Uma biografia de Clarice Lispector (Rocco)
Postado por Irla
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terça-feira, 8 de junho de 2010
A crítica
Quadrinhos tem o dom de nos fazer rir das pequenas coisas do dia-a-dia. Tem um toque infantil mas, quase sempre, carregam uma profundidade de conteúdo.
Passeando pela net encontrei, no Livros e Afins o seguinte texto.
A crítica
Esta tirinha, do Ryot Iras, se aplica a toda atividade humana sujeita a críticas.
Escritores, por exemplo, vão se identificar com ela. Eu mesmo, como editor de blogs, às vezes ouço que editar blogs não é trabalho e que quem trabalha com isso deveria “procurar um emprego que desse um dinheiro suado” (como se o que eu faço não exigisse suor; e bom suor).
Não ouço diretamente, é claro; creio que tais pusilânimes não tem coragem de se dirigir diretamente a mim. Mas indiretamente já é o suficiente. No entanto, a tirinha abaixo diz claramente o que eu penso a respeito:
Há um filme de Woody Allen, Igual a Tudo na Vida, em que o personagem aconselha um jovem escritor com algo como: ouça todos os conselhos, ouça todas as críticas; depois continue fazendo como você acha que deve fazer.
Acho que é assim.
Postado por Irla
Passeando pela net encontrei, no Livros e Afins o seguinte texto.
A crítica
Esta tirinha, do Ryot Iras, se aplica a toda atividade humana sujeita a críticas.
Escritores, por exemplo, vão se identificar com ela. Eu mesmo, como editor de blogs, às vezes ouço que editar blogs não é trabalho e que quem trabalha com isso deveria “procurar um emprego que desse um dinheiro suado” (como se o que eu faço não exigisse suor; e bom suor).
Não ouço diretamente, é claro; creio que tais pusilânimes não tem coragem de se dirigir diretamente a mim. Mas indiretamente já é o suficiente. No entanto, a tirinha abaixo diz claramente o que eu penso a respeito:
Há um filme de Woody Allen, Igual a Tudo na Vida, em que o personagem aconselha um jovem escritor com algo como: ouça todos os conselhos, ouça todas as críticas; depois continue fazendo como você acha que deve fazer.
Acho que é assim.
Postado por Irla
quarta-feira, 2 de junho de 2010
Espinhos da Frô
Há tempos não postamos nada da Frô do nosso jardim.
Pois bem, hoje teremos espinhos da Frô, que por sinal retrata uma inquietação incomodada que vira e mexe nos atinge.
pouquinho incomodado
Respirar incomoda,
comer incomoda,
dormir incomoda,
falar incomoda,
sonhar incomoda,
sorrir incomoda,
pensar incomoda,
rezar incomoda,
desviar incomoda,
mentir incomoda,
comungar icomoda,
desejar incomoda,
zoar incomoda,
brincar incomoda,
amar incomoda,
acertar ncomoda,
relacionar incomoda,
jogar incomoda,
errar incomoda,
beijar incomoda,
esconder incomoda,
gracejar incomoda,
brigar incomoda,
bordar incomoda,
viver incomoda,
transitar incomoda,
escrever incomoda,
brindar incomoda,
comunicar incomoda,
saber incomoda,
esquecer incomoda,
morrer incomoda,
murmurar incomoda,
hesitar incomoda,
tecer incomoda,
pedir incomoda,
reclamar incomoda,
conceder incomoda,
dar incomoda,
triturar incomoda,
pintar incomoda,
cruzar incomoda,
trotar incomoda,
pestanejar incomoda,
incomodar incomoda.
Eu incomodo,
você incomoda,
você se incomoda,
nós incomodamos,
nós nos incomodamos,
vocês incomodam,
vocês se incomdam
vocês me incomodam,
vocês nos incomodam,
eu me incomodo.
Frô
Postado por Irla
Pois bem, hoje teremos espinhos da Frô, que por sinal retrata uma inquietação incomodada que vira e mexe nos atinge.
pouquinho incomodado
Respirar incomoda,
comer incomoda,
dormir incomoda,
falar incomoda,
sonhar incomoda,
sorrir incomoda,
pensar incomoda,
rezar incomoda,
desviar incomoda,
mentir incomoda,
comungar icomoda,
desejar incomoda,
zoar incomoda,
brincar incomoda,
amar incomoda,
acertar ncomoda,
relacionar incomoda,
jogar incomoda,
errar incomoda,
beijar incomoda,
esconder incomoda,
gracejar incomoda,
brigar incomoda,
bordar incomoda,
viver incomoda,
transitar incomoda,
escrever incomoda,
brindar incomoda,
comunicar incomoda,
saber incomoda,
esquecer incomoda,
morrer incomoda,
murmurar incomoda,
hesitar incomoda,
tecer incomoda,
pedir incomoda,
reclamar incomoda,
conceder incomoda,
dar incomoda,
triturar incomoda,
pintar incomoda,
cruzar incomoda,
trotar incomoda,
pestanejar incomoda,
incomodar incomoda.
Eu incomodo,
você incomoda,
você se incomoda,
nós incomodamos,
nós nos incomodamos,
vocês incomodam,
vocês se incomdam
vocês me incomodam,
vocês nos incomodam,
eu me incomodo.
Frô
Postado por Irla
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