quinta-feira, 10 de junho de 2010

Ruído de passos por Adriana Falcão

Iniciando a sequencia de posts, de apresentações dos contos de Clarice Lispector, do livro Clarice na cabeceira ,trago comentários de Adriana Falcãocom sobre seu conto selecionado.



Para os que não conhecem ela é é uma roteirista e escritora brasileira. Atualmente, roteirista da TV Globo, escreve para séries como Comédias da Vida Privada e A Grande Família, além de roteiros para cinema e a série Mulher.

CONTO: Ruído de passos
DO LIVRO: A VIA CRUCIS DO CORPO
APRESENTAÇÃO: Adriana Falcão

“Sabia, gosto de você chegar assim, arrancando páginas dentro de mim desde o primeiro dia.”
Chico Buarque

GOSTO QUANDO CLARICE chega assim e me dá uma rasteira.

Aconteceu com “Ruídos de passos”.

Comecei a me apaixonar por dona Cândida Raposo nas primeiras linhas do conto.

Quem não se apaixonaria por uma velhinha de 81 anos que tem vertigem de viver?

“A altitude”, “o verde das árvores”, “a chuva”, “arrepios com Liszt”, “perfume de rosa”, e vamos compreendendo a vertigem de dona Cândida. Até que ela nos surpreende, quando vai ao consultório médico se queixar que “ainda tem a coisa”. Além de “a coisa”, dona Cândida também se refere ao seu desejo de prazer como “o inferno”. O diagnóstico do médico é preciso: “é a vida”.

Quando achamos que era isso, que idéia corajosa, um conto sobre uma velhinha aristocrática que ainda sente volúpia sexual, e decide, sem mais alternativas, resolver seu problema sozinha, claro que Clarice vai além.

A filha que espera no carro, lá fora, o filho morto na guerra e “a intolerável dor no coração de sobreviver a um ser adorado”, e lá vou eu me apaixonando cada vez mais por essa dona Cândida, gente, bicho, ser vivo. E não é que ela resolve se satisfazer sozinha, todas as noites, “sempre tristes”, “esperando a bênção da morte?”

O ruído de passos de seu marido, Antenor Raposo, me assusta como um filme de suspense.

E eu sinto a vida como um filme de suspense, e adoro e odeio minhas vertigens.

Postado por Irla

Um comentário:

  1. Clarice revela um lado da mulher até hoje vetado, anormal e cheio de preconceito. O conto é contemporâneo e libertador.

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